sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Carvões

Os carvões são doenças que se caracterizam pela produção de massas pulverulentas escuras na parte aérea das plantas. Estas massas são constituídas por estruturas reprodutivas do patógeno, fato que torna os carvões prontamente identificáveis, não tanto pelos sintomas, mas, principalmente, pelos sinais presentes nas plantas doentes.
Os carvões têm distribuição generalizada, atingindo praticamente todas as áreas do mundo onde se pratica a agricultura. Os cereais, como trigo, milho, cevada e aveia, são constantemente afetados pela doença. É também um problema sério para outras culturas, como cana-de-açúcar, cebola e cravo ornamental.
A maior frequência de ataque de carvão é verificada nos grãos ou sementes, em razão do patógeno atingir o ovário das plantas; neste caso, que compreende os carvões dos cereais, o fungo desenvolve-se e produz uma massa escura de esporos (soros) que substitui o conteúdo dos grãos. Os soros podem ser formados também nas folhas, hastes ou componentes florais, dependendo do hospedeiro. Quando tecidos tenros, provenientes da germinação da semente, são atacados pelo patógeno ou quando este atinge o ovário de uma planta adulta, e a respectiva semente é colocada para germinar, ocorre infecção sistêmica da nova planta. Por outro lado, quando o fungo coloniza todos tecidos meristemáticos, a infecção é do tipo localizada.
Os carvões são causados por fungos basidiomicetos e compreendem, aproximadamente, mil e cem espécies capazes de infectar plantas pertencentes a mais de setenta e cinco famílias botânicas. Estes fungos apresentam especificidade em relação ao hospedeiro, inclusive com ocorrência de raças fisiológicas. São considerados parasitas obrigatórios e desenvolvem uma forma de parasitismo evoluído, apesar de, geralmente, não formarem haustórios.
Como parasitas evoluídos, os patógenos convivem por longo tempo com o hospedeiro antes que os sintomas se tornem visíveis. No caso dos carvões de cereais, o patógeno desenvolve-se às custas da planta desde a germinação da semente e os danos manifestam-se, normalmente, no estádio de formação dos grãos. O patógeno afeta as plantas atacadas tanto pela retirada de nutrientes como por modificações que causa no desenvolvimento de meristemas e grãos. Durante o ciclo vital do fungo, são produzidos basicamente dois tipos de esporos, os teliósporos e os basidiósporos, além de micélio primário (monocariótico) e micélio secundário (dicariótico). Os esporos são facilmente disseminados pelo vento, podendo atingir hospedeiros localizados nas proximidades ou a grandes distâncias da fonte de inóculo.

Sintomatologia:
Carvão em Milho provocado por Ustilago maydis.
Os carvões podem se manifestar de diferentes formas em relação ao hospedeiro. No caso de trigo e aveia, os sinais tornam-se evidentes na fase de emissão e formação das espigas e panículas, quando se observa a presença de massas escuras que substituem os grãos. As espigas e panículas tornam-se escuras e liberam facilmente um pó preto, que corresponde aos teliósporos do fungo. No milho, os grãos são substituídos por estruturas semelhantes a bolhas totalmente preenchidas por teliósporos do patógeno. Estas estruturas escuras têm um tamanho várias vezes maior que um grão de milho normal, e devido à hiperplasia, provocam uma deformação na espiga como um todo. A ocorrência do carvão em cebola assemelha-se aos sintomas de danos em plântulas do tipo pós-emergência (damping-off), pois os tecidos jovens mostram-se muito suscetíveis. Na cana-de-açúcar, o meristema apical sofre uma modificação e passa a formar um apêndice. Esta estrutura, denominada chicote, é recoberta por uma película prateada e contém uma massa escura formada por esporos do fungo. Assim, de modo geral, os carvões são identificados principalmente com base nos sinais, ou seja, nas estruturas do patógeno associadas às plantas doentes. Estas estruturas são produzidas no interior de partes vegetais modificadas, principalmente grãos e meristemas, e tornam-se evidentes na forma de massas escuras e pulverulentas.
Além da presença dos sinais, em alguns casos podem ocorrer outros tipos de sintomas, como subdesenvolvimento, perfilhamento excessivo e, mais raramente, morte do hospedeiro.

Etiologia:
Diversos gêneros pertencentes ao grupo dos basidiomicetos estão associados aos vários tipos de carvões que ocorrem em plantas cultivadas, com destaque para o milho, o trigo, a aveia e a cana-de-açúcar.
Estes patógenos apresentam especificidade quanto ao hospedeiro, são parasitas evoluídos e obrigatórios. Normalmente formam esporos, como teliósporos e basidiósporos, e desenvolvem micélio monocariótico (primário) e dicariótico (secundário). Formam, também, estruturas do tipo soro, que contém os teliósporos.

Ciclo da Relação Patógeno-Hospedeiro:
Os patógenos que causam os carvões atuam como parasitas obrigatórios e, na ausência do hospedeiro no campo, têm sua sobrevivência assegurada, principalmente, pelos teliósporos. Estes esporos podem estar presentes em sementes contaminadas, restos de cultura e no solo. Em alguns casos micélio dormente é encontrado nos tecidos internos da semente. Por esta razão, restos de cultura e sementes são as principais fontes de inóculo da doença. A disseminação é feita pela água de enxurrada ou irrigação, que arrasta os propágulos existentes no solo, dispersando-os dentro da área de plantio. O vento é o agente que promove a disseminação do patógeno a longas distâncias, quando o inóculo está presente nas espigas de cereais ou nos chicotes de cana-de-açúcar. A água, na forma de respingos, também dissemina este inóculo na própria planta e para plantas vizinhas. Assim, quando o agente de disseminação é o vento, o inóculo não necessariamente tem origem na própria área ocupada pela cultura, mas pode ser proveniente de outras áreas. A infecção de um hospedeiro pode ocorrer de diferentes formas. A infecção do embrião ocorre quando um esporo disperso pelo vento atinge o estigma de uma flor que, após germinação, instala-se no ovário; em seguida, o micélio permanece dormente na semente; posteriormente, desenvolve-se, de modo sistêmico, na planta proveniente da germinação da semente infectada; finalmente, manifesta-se na fase de formação de espigas ou panículas.  A infecção de plântulas tem origem a partir de uma semente contaminada externamente por teliósporos; estes germinam e infectam o coleóptilo; em seguida, o micélio desenvolve-se sistemicamente nos tecidos vegetais; por fim, as panículas passam a exibir massas de esporos no lugar dos grãos. A infecção de meristema, como no caso da cana-de-açúcar, ocorre quando o esporo atinge uma gema, provocando modificação no seu desenvolvimento e dando origem a uma estrutura diferente daquela normalmente produzida pela gema; no final do ciclo, são formados esporos que ocupam esta estrutura. Tanto os teliósporos, dispersos a partir de um hospedeiro vivo como aqueles que passaram por um período de sobrevivência, germinam e formam um tubo germinativo ou promicélio, que se transforma em um basídio. Este, posteriormente, dará origem aos basidiósporos. Estes esporos sexuados germinam, originando o micélio primário, que pode até penetrar os tecidos do hospedeiro, não conseguindo, porém, colonizá-los. O micélio secundário origina-se a partir da plasmogamia entre dois micélios primários compatíveis. A penetração se processa de forma direta, quando o patógeno atinge a superfície de um tecido suscetível. A colonização ocorre predominantemente através do crescimento inercelular do micélio secundário, normalmente sem a presença de haustórios. Os sintomas aparecem de diferentes formas: nos cereais, como trigo, aveia, milho e outros, o conteúdo dos grãos é substituído por massas pulverulentas escuras constituídas de teliósporos; os sintomas na cana-de-açúcar manifestam-se, principalmente, na forma de uma apêndice filiforme (chicote), cujo interior contém os teliósporos. A reprodução do patógeno ocorre quando as hifas dicarióticas, que se desenvolvem dentro dos grãos ou nos meristemas, sofrem clivagem. Cada célula que compõe o micélio transforma-se em um teliósporo. Esta massa de teliósporos é, inicialmente, recoberta por uma película de tecido do próprio hospedeiro, a qual, posteriormente, rompe-se, permitindo a dispersão dos esporos. Os fatores ambientais que interferem mais diretaente na ocorrência e desenvolvimento dos carvões são a temperatura e a umidade. O carvão da cana-de-açúcar e o carvão do milho são favorecidos em regiões de alta umidade e temperatura relativamente elevada (25-30°C); os carvões dos cereais de inverno são mais severos em condições de temperatura mais amena (16-20°C) e elevada umidade.



Referências


AMORIM, Lilian; REZENDE, Jorge Alberto Marques; FILHO, Armando Bergamin. Manual de Fitopatologia: Princípios e Conceitos. Vol 1. Ed 4. Piracicaba: Agronômica Ceres. 2011. p. 487-490.

Nenhum comentário:

Postar um comentário